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9 razões porque dinheiro público em games (ainda) é fundamental no Brasil

Paulão

05/07/2019 17h33

Nesta semana, houve duas excelentes notícias para o mercado de jogos, especialmente para os desenvolvedores do Estado de São Paulo: o Governo do Estado e a SPCine anunciaram editais de investimentos que somam mais de R$ 3,5 milhões no setor de games – o que é extremamente positivo, especialmente para uma indústria que ainda carece de políticas públicas estruturadas.

GUTS, game criado com recursos próprios e de edital

GUTS, game brasileiro para PC e em breve para PS4 e Xbox One, foi criado pela Flux Games com investimento próprio aliado a recursos públicos de edital da Ancine

Para o desenvolvimento e publicação de games em São Paulo, o Governo do Estado injetará R$ 2,4 milhões e a SPCine disponibilizará R$ 1,15 milhão. Isso significa recurso público – dinheiro meu, seu, de todos nós que moramos nesta região – sendo alocado para a criação de jogos nacionais. E isso é maravilhoso. Quer saber por que? Vamos lá!

Spoiler -Por estes motivos aqui:

  1. Injeta grana e Ânimo
  2. Faz os desenvolvedores evoluírem
  3. Gera novas Propriedades Intelectuais
  4. Dá espaço pra gente nova
  5. Atrai a atenção internacional
  6. Gera receita de exportação
  7. É adequado para o nosso momento
  8. Dá retorno
  9. É o que tem pra hoje

Aos detalhes!

1-) Injeção de grana e de ânimo

Quando um estúdio vence um edital de criação de games, significa que terá recursos para desenvolver o projeto e colocá-lo no mercado sem aquela aflição de "não tenho dinheiro para pagar as contas do mês" – ou tendo que manter bicos e trabalhos em outras áreas para sustentar o desenvolvimento do seu game. Isso significa gerar foco e ânimo, e desenvolvedores focados e animados produzem games melhores.

2-) Evolui o desenvolvedor gerando empregos

Seja de modo formal ou informal, uma injeção de dinheiro em projetos de game gera muitos empregos no setor. E a indústria de games precisa gerar trabalho para evoluir. O Brasil não tem uma longa tradição de desenvolvimento de games – ele começou a se estruturar com maior robustez há cerca de dez anos – e, por isso, precisa de projetos para que as pessoas possam trabalhar, aprender e evoluir, tornando-se mais sêniors em seus papéis. O país está fazendo bonito ao correr atrás do prejuízo, com alguns jogos de alto nível e reconhecimento internacional mesmo sem décadas de indústria, mas precisamos de mais projetos e mais trabalhos para amadurecer nossos desenvolvedores e, com isso, criar um volume maior de jogos competitivos em termos de qualidade no cenário global.

No Heroes Here é um premiado game cooperativo criado pela paulistana Mad Mimic com recursos de edital da SPCine

3-) Permite criação de Propriedades Intelectuais

Muitos estúdios brasileiros e paulistas se dividem entre trabalhos autorais, ou seja, criação dos próprios jogos, com seus personagens e universos, e trabalhos sob encomenda, como jogos para clientes e empresas que os contratam para desenvolver. Muitas vezes, o lucro dos projetos de encomenda é reinvestido nos projetos autorais, só que isso significa desenvolvimento lento, aos pouquinhos, pois há contas para pagar e isso costuma ser a prioridade. Vencer um edital dá aos estúdios a possibilidade de concentrar os esforços nas criações de produtos de propriedade intelectual, que tem o potencial de alçar a empresa a novos patamares criativos e técnicos.

4-) Novos criadores

Alguns editais possuem cotas para novos criadores. Isso é bacana pois confere a empresas e pessoas novas no mercado uma chance de produzir seus projetos. No entanto, é preciso ter bastante cautela neste ponto para não colocar muito dinheiro nas mãos de pessoas com pouca experiência que podem, mesmo sem intenção, não gerir os recursos de forma eficaz e desperdiçá-los.

5-) Olhar internacional

Os olhos do mercado internacional de desenvolvimento já olham para o Brasil de outra forma hoje, se comparado há cinco anos atrás. Somos vistos como um país promissor e criativo dentro do universo de games. Isso se dá principalmente pela quantidade de bons games que tem saído dos nossos estúdios. Claro, não temos nenhum AAA por aqui, mas temos jogos incríveis em seus escopos e propostas. Muito disso é fruto de editais criados pela Ancine nos últimos anos, que injetaram dezenas de milhões de reais no setor e geraram diversos games de alto nível. Então um novo ciclo de editais promete entregar resultados mais interessantes – e jogos mais lucrativos.

6-) Jogo é exportação

Na esmagadora maioria dos casos, games são produtos de exportação. Isso significa que investir em jogos resulta em exportar capital intelectual e faturar em moeda estrangeira. Bem, você pode imaginar como é bom vender em dólar e pagar conta em real. Então esta é uma maneira limpa e prática de aumentar as receitas locais em exportação, já que quase sempre é tudo feito digitalmente, com games comprados e baixados pela internet, sem desafios logísticos, de frete e afins.

Mana Spark

Mana Spark é um Roguelike brasileiro que também teve recursos de edital

7-) O momento pede

Editais não solucionam um setor, mas ajudam bastante a amadurecê-lo. O setor não pode contar com editais como condição necessária para sobreviver – é muito importante que as empresas de games andem com as próprias pernas e criem produtos lucrativos. Mas no momento em que estamos, com tudo sendo muito recente e competindo com empresas de países que investem nisso desde as décadas de 70 e 80 (como EUA e Japão) ou 90 (como Canadá, Reino Unido e muitas da Europa, Coréia do Sul), os editais são uma injeção muito bem vinda enquanto o Brasil não cria uma política pública estruturada para o setor produtivo de jogos.

8 -) Potencial de retorno

Games é um mercado gigantesco e que movimenta muita grana. Claro, não é fácil fazer um game dar certo comercialmente – mas as chances deste dinheiro retornar para os cofres públicos são reais e muito possíveis. Inclusive, dependendo do formato do edital, um só game muito bem sucedido financeiramente pode compensar por outros diversos que não tenham tido a mesma sorte, mais ou menos no modelo de investimento anjo em startups – investe-se em diversas, e as poucas que dão certo compensam pelas muitas que não vingaram.

9-) É o que tem para hoje ¯\_(ツ)_/¯

Países como Canadá tem políticas públicas estruturadas, agressivas e claras para fomentar o desenvolvimento do setor de games em seu território – não à toa tornam-se potências mundiais e exportam bilhões de dólares. Enquanto o Brasil está anos luz distante de ter políticas públicas fortes para o setor, editais como estes são uma excelente maneira prática de dar algum apoio de curto prazo aos estúdios, o que já ajudou a gerar um aumento de faturamento 150% por aqui nos últimos anos.

Importante frisar que a Flux Games, empresa que dirijo, já foi contemplada em alguns editais, e sempre foi algo espetacular para nosso desenvolvimento. Estes incentivos públicos, ainda que pontuais, fazem uma diferença gigante no dia a dia de quem está trabalhando para construir estúdios melhores e, de uma forma geral, um setor de jogos mais profissional e maduro.

Curtiu esse texto? Maravilha! Siga o  Blog do Paulão para saber mais sobre os bastidores do desenvolvimento de games, os segredos desta indústria complexa e encantadora, os detalhes dos games e das suas mecânicas, as mágicas por trás do que vemos na tela quando jogamos, o progresso da cena de desenvolvimento de games no Brasil e tudo mais que disser respeito à indústria de games sob o ponto de vista do desenvolvedor.

Sobre o Autor

Paulão é criador e desenvolvedor de games. Fundou e dirige, desde 2012, a Flux Games, estúdio que já trabalhou em diversos jogos - uns mais anônimos, outros mais populares. Como jogador, passou por todas as gerações de consoles, tem um carinho especial por jogos que inventem qualquer coisa inovadora e só precisa de um copo (ou vinte) no boteco para aceitar um debate sem fim sobre os melhores e piores games da história.

Sobre o Blog

Criar jogos é como ser aquele mágico de rua: fazemos o jogador olhar para uma mão, enquanto desenrolamos uma gambiarra maluca aqui na outra - escondendo o trabalho sujo que faz o game rodar e ser divertido. O Blog do Paulão vai abordar segredos e técnicas que a disciplina de desenvolvimento de games utiliza para realizar essas mágicas e deixar os games mais difíceis, assustadores, inesquecíveis, engraçados...